segunda-feira, outubro 24, 2005

O Jornal O Globo continua fingindo que Reinaldo Azevedo não é colunista. E eu continuo disponibilizando os textos dele aqui. Como não achei o link, segue o texto de 22 de outubro na íntegra.


Eis Lula,o reaça

Na quinta, o PCdoB recebeu Lula, em seu congresso, aos gritos de “Viva o socialismo” e “Abaixo o imperialismo”.

Foi na Academia de Tênis, em Brasília. O local é freqüentado pelos endinheirados da cidade. Finalmente alguém tem a idéia de combater a burguesia, mas com conforto. No Araguaia, a natureza e o povo eram hostis à revolução. Se o Exército não tivesse passado fogo nos “revolucionários”, estes acabariam passando fogo naquele povinho que não reconhece que liberdade é escravidão.

O PCdoB ainda não acatou as críticas de Krushev a Stalin, como deixa claro o seu site.

O apedeuta, é claro, falou. Atribuiu suas dificuldades a ter sido eleito presidente com uma Constituição parlamentarista. Então ele tentou ser um “presidente presidencialista”, como Chávez, comprando o Congresso. Não conseguiu. Mas promete tentar de novo. Lula é uma piada perigosa. Na mesma quinta, participou, com desocupados, da abertura de um seminário internacional sobre o Bolsa Família. A ONU estava lá. Trata-se daquela ONG inútil de antiamericanos sustentada pelos EUA. Se sou Bush, eu a deixo a pão, água e Kofi Annan — leiam “The future of de United Nations”, de Joshua Muravchik. Lula afirmou que pouco importa se o programa é assistencialista. Que importa que a mula é manca? Ele quer é rosetar. Segundo disse, as bolsas atendem aos interesses da classe média porque tiram crianças das ruas.

Desde Antônio Carlos de Andrada, governador de Minas, não se via nada tão obviamente reacionário em vestimenta supostamente progressista — o que, para certa esquerda, é a mesma coisa. “Façamos a revolução antes que o povo a faça”, disse o mineiro, convidando seus pares a dar um pé no traseiro de Washington Luiz e Júlio Prestes. Era a versão modernizada de “Pedro, põe a coroa sobre a tua cabeça antes que algum aventureiro lance mão dela”. A Independência e a Revolução de 30, até malgrado seus atores, implicaram avanços.

Lula é só atraso com suas ambigüidades sem ambivalências. À diferença de Antônio Carlos, não teme o povo. Ele o quer mais ou menos mobilizado para usá-lo como instrumento de chantagem. É um populista vulgar adaptado às regras de mercado. À dona Zelite, exibe-se como o bom mestiço domesticador de escravos. Seu “programa social”, que tem porta de entrada, mas não de saída, não distribui renda ou tira as pessoas da miséria. Ao contrário: esta é seu maior patrimônio. Em lugar da indústria da seca, a indústria das bolsas. O petista é o maior coronel do Brasil. À classe média e aos ricos, o “socialista antiimperialista” quer posar de higienizador: limpa as ruas da sujeira, da pobreza, das crianças miseráveis — o que, de resto, é mentira.

Enquanto isso, seu ministro da Fazenda, Antonio Palocci, reúne-se com oposicionistas para que estes asseverem às agências de classificação de risco que as eleições de 2006 não trarão turbulências à economia. Lula precisa provar mais fidelidade ao mercado do que a Argentina, que, apesar de ter dado o maior calote da história do capitalismo, tem hoje um risco igual ao do Brasil. Ele, aliás, confessou que teve de exagerar nos juros para ganhar credibilidade, admitindo, então, o custo PT, pago por nós.

A equação não é para iniciantes. Um populista bifronte, com uma face vulgar e outra mercadista, mobiliza seu homem forte para atrair para a arapuca do continuísmo as oposições contra as quais ganhou as eleições, acusando-as de conservadoras. Elas, por sua vez, são reféns desse jogo e não vão, por ora, além de onde Roberto Jefferson lhes passou o bastão. Enquanto isso, a vaca, com febre, vai para o brejo, mas não no Amazonas esturricado de sede e fome.

O desgoverno é óbvio. O combate à aftosa recebeu neste ano menos de R$600 mil. R$30 milhões foram liberados para atender à população ribeirinha do Norte do país. É 49 vezes menos do que custou a eleição de Aldo Rebelo para a presidência da Câmara: R$1,5 bilhão. Aldo é do PCdoB.

Na quinta, o PCdoB recebeu Lula, em seu congresso, aos gritos de “Viva o socialismo” e “Abaixo o imperialismo”.

REINALDO AZEVEDO é jornalista.